A lei 11.101/2005 não previa o litisconsórcio ativo no processo de recuperação judicial. No entanto, a jurisprudência pátria, juntamente com a doutrina, admitia a incidência, distinguindo, ainda, em duas categorias: consolidação processual e consolidação substancial.
Diante da lacuna legal e da necessidade de usufruir do instituto para melhores chances de soerguimento de pessoas jurídicas em crise pertencentes de um mesmo grupo econômico, aplicou-se, até então, o artigo 189 da Lei de Recuperação Judicial e Falência – LRF, o qual determina a aplicação do Código Processual Civil – CPC de forma subsidiária. Dessa forma, gozaram da aplicação do artigo 113 do CPC, até a atualização legal em dezembro de 2020.
Com a reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falências, advinda pela Lei 14.112/2020, tornou-se expressa a possibilidade de pluralidade de devedores em um único processo recuperacional. Para tal, terão que ser preenchidos os requisitos legalmente previstos.
No caso de uma consolidação processual, observa-se que algumas sociedades pertencentes a um grupo, cujo controle societário seja comum, podem requerer o litígio em conjunto, não havendo a obrigatoriedade de inclusão de todas as empresas do grupo. O objetivo desse instituto recai na economia processual, além de evitar decisões contraditórias que possam causar prejuízos às pessoas jurídicas contempladas pelo processo recuperacional.
O juízo competente para o deferimento do processo de recuperação judicial sob a consolidação processual é o local do principal estabelecimento. Trata-se de tema ainda não consolidado na legislação, mas, diante de entendimentos dos tribunais e doutrinários, esse local independe do endereço no contrato social, podendo ser onde tomam as decisões e se concentra o maior volume de negócios da empresa.
Por outro lado, o novel artigo 69-J da lei 11.101/05, possibilita ao Juízo Universal a consolidação substancial dos ativos e passivos dos devedores integrantes do mesmo grupo econômico que, inclusive, já estejam em recuperação judicial sob consolidação processual. No entanto, tal medida deve ser tomada em caráter excepcional, apenas quando ficar demonstrada a interconexão e a confusão entre ativos e passivos dos devedores, de modo que não seja possível identificar a sua titularidade sem excessivo dispêndio de tempo ou de recursos.
Além disso, a lei determina que deve haver, cumulativamente, a ocorrência de, no mínimo, duas das seguintes hipóteses: existência de garantias cruzadas; relação de controle ou de dependência; identidade total ou parcial do quadro societário; e/ou atuação conjunta no mercado entre os postulantes. Contemplados todos os requisitos, pode o juiz competente deferir, inclusive, de imediato a consolidação substancial.
Ademais, no que tange a consolidação processual, o grupo requerente não precisa relacionar todas as empresas para que seja deferido o processamento da recuperação, como também o juiz competente não está obrigado a incluir todas no polo ativo. Já na consolidação substancial, entende-se que deverão ser contempladas todas as sociedades pertencentes ao grupo, ou seja, mesmo que não tenha sido arrolada no requerimento, será determinada a inclusão.
Um fator relevante a ser destacado é a apresentação do plano de recuperação judicial no prazo legal. Aduz o artigo 69-I, § 1º, da LRF, que em caso de consolidação processual, há a possibilidade de os devedores apresentarem meios de recuperação independentes e específicos para a composição de seus passivos, admitida a sua apresentação em plano único. Dessa maneira, deverá ocorrer, também, assembleia gerais de credores isoladas para cada empresa, cujos quóruns de instalação e deliberação também deverão ser distintos para cada devedor.
No tocante a consolidação substancial, o plano de recuperação judicial será apresentado de forma unitária, contemplando todas as empresas do grupo e unificando o pagamento para todos os credores, independente do devedor. Neste instituto será realizada uma assembleia única para deliberação em conformidade ao artigo 69-L da lei de recuperação judicial e falência.
Diante do alegado, verifica-se que o regramento legislativo deixa clara e objetiva a diferença entre os institutos, bem como, unifica e positiva os entendimentos diversos sobre o tema.
Referências bibliográficas:
1-Sacramone., Marcelo Barbosa. Comentário à lei de recuperação judicial e falência/ Marcelo Sacramone. 2.ed. – São Paulo : Saraiva Educação.2021.
2-Costa, Daniel Carnio. Comentários à lei de recuperação de empresas e falência:Lei 11.101, de 09 de fevereiro de 2005/ Daniel Carnio Costa, Alexandre Correa Nasser de Melo – Curitiba: Juruá.2021.
3- DA SILVA, L. I. L.; BASTOS, M. T.; FILHO, A. P.; BERZOINI, R. J. R.; FURLAN, L. F. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Acesso em: 14 de mai. de 2021.
Por Paula David de Sousa Camello, advogada atuante na área de Recuperação Judicial e Falências e Paulo Roberto de Souza Junior, advogado, administrador judicial, especialista em Direito Civil e empresarial pela UFPE. Pós-graduado em Direito do Trabalho pela ESA-PE. Pós-graduando em Recuperação Judicial, Falência e Gestão Judicial pela UNIABA – Universidade Coorporativa da Associação Brasileira de Advogados. Atuante na área de Recuperação Judicial e Falência.