Por Esdras Dantas
O processo de inventário e partilha de bens é um dos procedimentos mais relevantes no âmbito do Direito das Sucessões. Ele visa organizar e distribuir os bens deixados por uma pessoa falecida aos herdeiros, seguindo as disposições legais ou testamentárias. No Brasil, o Código de Processo Civil (CPC) de 2015 traz uma estrutura clara para o inventário, prevendo tanto a modalidade judicial quanto a extrajudicial. O artigo 610 do CPC disciplina os cenários em que o inventário deve ser processado de forma judicial, especificando os casos de obrigatoriedade e as condições em que o inventário extrajudicial é permitido.
Inventário Judicial: A Obrigatoriedade em Casos de Testamento e de Herdeiros Incapazes
O caput do artigo 610 estabelece que o inventário será necessariamente judicial quando houver testamento deixado pelo falecido ou quando existir um herdeiro incapaz, como menor de idade ou pessoa interditada. Essa disposição busca garantir maior segurança jurídica, uma vez que tanto o testamento quanto a situação de incapacidade demandam uma análise judicial que assegure o respeito aos direitos dos envolvidos.
No caso de testamento, o controle judicial se faz necessário para garantir a fiel execução da última vontade do falecido, evitando fraudes e interpretando de forma criteriosa as disposições testamentárias. Em relação aos herdeiros incapazes, o objetivo é proteger aqueles que não têm plena capacidade de discernimento ou autonomia jurídica, assegurando que seus direitos sejam devidamente representados e preservados.
Inventário Extrajudicial: Capacidade e Concordância dos Herdeiros
O §1º do artigo 610 introduz a possibilidade do inventário e partilha serem feitos por escritura pública, caso todos os herdeiros sejam capazes e concordes quanto à divisão dos bens. A escolha pelo inventário extrajudicial tem como objetivo proporcionar um procedimento mais célere e menos oneroso, especialmente quando não existem litígios ou questionamentos entre os envolvidos.
Essa modalidade de inventário, instituída pela Lei n.º 11.441/2007, trouxe significativos avanços para o Direito das Sucessões brasileiro, simplificando a tramitação em casos de heranças simples e desafogando o Judiciário. A escritura pública lavrada em cartório se torna um documento hábil para todas as finalidades legais, como o registro de imóveis e o levantamento de valores depositados em instituições financeiras. A segurança jurídica é preservada, uma vez que o tabelião tem a responsabilidade de conferir os requisitos formais e verificar a ausência de litígios entre as partes.
A Assistência de Advogado ou Defensor Público: Garantia de Segurança Jurídica
O §2º do artigo 610 exige que todas as partes interessadas no inventário extrajudicial estejam assistidas por um advogado ou defensor público, que deve assinar o ato notarial juntamente com os herdeiros. Essa exigência se justifica pela necessidade de assegurar que os herdeiros compreendam plenamente os termos do acordo e que seus direitos estejam sendo respeitados de acordo com a legislação aplicável.
A presença de um advogado garante a análise dos aspectos patrimoniais e sucessórios, bem como orienta as partes quanto às implicações jurídicas de suas decisões. Nos casos em que os interessados não dispõem de recursos para contratar um advogado, o defensor público assume essa função, assegurando o princípio da igualdade de acesso à justiça.
Novas Autorizações do CNJ: Inventário Extrajudicial com Herdeiros Menores
Em 2024, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma importante mudança, permitindo que inventários extrajudiciais também possam ser realizados em casos que envolvem herdeiros menores de idade ou incapazes. Segundo a Resolução nº 571, o inventário pode ser processado extrajudicialmente, desde que haja consenso entre todos os herdeiros e que o menor ou incapaz receba a parte ideal a que tem direito. O documento lavrado deve, ainda, ser encaminhado ao Ministério Público para um parecer. Se o MP concluir que a divisão é justa e protege o herdeiro menor, o inventário poderá ser concluído em cartório. Caso contrário, o processo deverá seguir para o Judiciário
Essa mudança representa um marco na desburocratização dos inventários, oferecendo mais agilidade para as famílias e reduzindo a sobrecarga do Judiciário. A nova regra também reflete uma preocupação com o direito dos herdeiros menores, ao exigir supervisão do MP e garantindo que não haja prejuízo à sua parte ideal.
Considerações Finais
O artigo 610 do Código de Processo Civil e a recente Resolução nº 571 do CNJ reforçam o esforço de modernização do processo de inventário, ao mesmo tempo em que garantem segurança e respeito aos direitos dos herdeiros. A dualidade entre o inventário judicial e o extrajudicial, agora ampliada para incluir herdeiros menores, traz flexibilidade ao sistema, permitindo que o procedimento seja adaptado conforme as particularidades de cada caso.
Dessa forma, o inventário extrajudicial com supervisão do MP promove uma alternativa prática e segura para resolver a partilha de forma consensual, sem necessidade de processos judiciais prolongados. Essas inovações contribuem para a celeridade processual e democratização do acesso à justiça, permitindo que situações simples possam ser resolvidas de maneira menos onerosa e mais rápida, e promovendo uma justiça acessível e inclusiva.