INCONSTITUCIONALIDADE DO PROVIMENTO CGJ-RJ Nº 46 / 2021

INCONSTITUCIONALIDADE DO PROVIMENTO CGJ-RJ Nº 46 / 2021

Foi publicado no DJERJ de 17/06/2021 (nº 186/2021 – Caderno I – Administrativo – pág. 16), o Provimento CGJ de nº 46 / 2021, determinando, no sentido de regulamentar, esclarecer e viabilizar a prática de atos notariais em razão da circunscrição territorial para qual o notário recebeu a sua delegação, entre outras coisas, que:

a)            sendo um dos signatários do ato notarial NÃO RESIDENTE na sede do serviço ao qual estará se prestando o serviço, a lavratura do ato deverá ser GRAVADA EM VÍDEO, com registro de imagem da presença de 3 EMPREGADOS DA SERVENTIA, e;

b)           NO VÍDEO, deverão conter, NO MÍNIMO, a identificação das partes, a demonstração de capacidade, a livre manifestação, o consentimento delas, a concordância com a escritura, o objeto, o preço pactuado, a data do ato, a hora da prática, a indicação do livro, página e serventia onde foi lavrado.

Não obstante a capacidade legal da Egrégia Corregedoria em organizar e corrigir os rumos do serviço para qual houve a delegação pelo Tribunal de Justiça, acredito que este normativo fira princípios doutrinários substanciais do ordenamento, e entre em claro conflito com dispositivos constitucionais.

De início, as serventias notariais e registrais são abarcadas pelo artigo 236 da CF, que deixa claro que será a LEI quem irá regulamentar a atividade e irá disciplinar as responsabilidades dos delegatários, ali não contemplando os atos normativos dos tribunais de justiça.

Em sede de lei, os notários e registradores estão sob as normas procedimentais da Lei nº 8.935/94, que é taxativa na vedação da prática de atos notariais fora da circunscrição para qual foi concedida a delegação (art. 9º), mas que também determina ser LIVRE A ESCOLHA do tabelião de notas, QUALQUER QUE SEJA O DOMICÍLIO DAS PARTES ou LUGAR DA SITUAÇÃO DO BEM (art. 8º), sem impor quaisquer tipos de restrições para a prática desses atos, tais como gravações em vídeo ou provas testemunhais.

Com base nesse dispositivo, o cidadão de qualquer parte do país pode escolher o cartório de notas para a prática de seu ato, devendo constar na escritura que o mesmo “se encontra ora de passagem pela cidade sede da serventia”, quando fora de seu município. Sempre foi assim.

Quando um normativo do tribunal delimita que se deva gravar um vídeo e ter 3 testemunhas, fere a sua própria determinação sobre a dispensa das testemunhas instrumentárias (art. 240 do Código de Normas da CGJ-RJ), além de REVOGAR, na prática, a FÉ PÚBLICA do tabelião (art. 3º, Lei nº 8.935/94), por presumir que a sua descrição em documento público já não é o suficiente, devendo provar o relatado por meios digitais e testemunhais.

Fere também o princípio constitucional e administrativo da ISONOMIA, já que coloca o delegatário do Estado do Rio de Janeiro em desigualdade de condições com os seus pares das outras unidades da federação, isentos desta rotina, além de criar categorias de cidadãos, os “de dentro” e os “de fora”, que terão procedimentos igualmente distintos para a prática do mesmo tipo de ato na mesma serventia, ferindo o art. 5º, caput, da CF (“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se o direito à igualdade…”).

Percebo que esta medida visa corrigir possíveis equívocos praticados; entretanto, da mesma forma, entendo que não se aplica uma norma de correição ferindo outros direitos positivados no ordenamento. Pode-se criar aí uma teratologia jurídica. É preciso um meio termo.

Para saber mais, acompanhe ou venha fazer parte da nossa comissão.

Por Cláudio Bordallo, presidente da Comissão de Direito Notarial e Registral da Associação Brasileira de Advogados no Rio de Janeiro.

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