É POSSÍVEL A PENHORA DE DIREITOS HEREDITÁRIOS?

Herdeiro insolvente pode ter o seu quinhão penhorado?

O devedor responde pela dívida com seus bens presentes e futuros. Entretanto, não são todos os bens que respondem pela execução, ou seja, há bens que não podem ser penhorados.

Daí surge a pergunta: é possível que direitos hereditários do devedor sejam objeto de penhora?

Para responder a esta pergunta, temos que observar que, quando uma pessoa falece, os seus bens são transmitidos imediatamente aos seus herdeiros. Via de regra, todos os bens deixados pela pessoa que faleceu compõem a herança como uma massa única.

O processo de inventário é necessário para que esses bens sejam partilhados, ou seja, individualizados e divididos entre os herdeiros. É na partilha que ocorre a divisão dos bens, seja em cota parte ou na totalidade de determinado bem para cada filho.

Enquanto não houver a partilha, todos os herdeiros são donos de todos os bens deixados pelo falecido, em condomínio. Todos são responsáveis pela conservação, manutenção, pagamento de impostos e taxas dos bens que compõem a herança. 

            Apesar disso, é possível a penhora de direitos hereditários, por força do artigo 835 do CPC, que permite a penhora sobre direitos. Note-se que a penhora não é sobre o bem individualizado, mas sobre direitos do executado. Não se trata de penhora de determinado bem dentro do monte total de bens do inventário, mas, sim, dos direitos que o devedor tem sobre tal patrimônio.

É plenamente viável a penhora de direitos e ações do herdeiro sobre bens do espólio, desde que dentro dos trâmites processo de inventário, recaindo a penhora no rosto dos autos, ou seja, a anotação da constrição no rosto dos autos do inventário de bens.

Neste caso, o oficial lavra o auto de penhora, intimando o escrivão do feito em que o direito constrito é litigioso, para que registre a penhora na capa dos autos.

O exequente será litisconsorte facultativo do executado, ou seja, coautor da ação,e assume a posição de credor do direito litigioso.

Caso o herdeiro devedor ou os demais herdeiros não tenham iniciado o processo de inventário, é permitido ao credor do herdeiro proceder a abertura do inventário, porquanto tem legitimidade concorrente, conforme dispõe o inciso VI do artigo 616 do CPC.

O herdeiro devedor não pode renunciar o direito à herança e os bens presentes e futuros do devedor respondem pelo inadimplemento da obrigação, à exceção daqueles impenhoráveis. Como é o patrimônio que garante suas dívidas, caracteriza fraude à execução a disponibilidade de bens pelo demandado, após a citação, que resulte em sua insolvência, frustrando a atuação da Justiça. Então, a renúncia aos direitos hereditários é considerada ineficaz com relação ao credor.

É importante atentar-se que é considerada fraude à execução a alienação ou oneração de bens quando correr, contra o devedor, uma demanda capaz de reduzi-lo à insolvência.  Por outro lado, o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado, ou da prova de má-fé do terceiro adquirente, na forma da Súmula 375, do STJ. Inclusive, de acordo com o entendimento consolidado pelo STJ, cabe ao credor comprovar a má-fé do devedor para fins de reconhecimento da fraude à execução.

A constrição dos direitos hereditários que o agravante possui está condicionada à ação de inventário, razão pela qual não é possível a transferência de valores ou venda dos bens que integram a herança para satisfação do credor, antes de ser realizada a partilha e individualizados os bens e direitos que eventualmente caberão ao herdeiro.

Sendo assim,  a penhora somente se concretiza quando concluído o inventário e homologada a partilha. A ideia é evitar prejuízo aos demais herdeiros, porque não é sabido quais bens e valores caberão a cada um deles.

A execução, portanto, poderá continuar, pois a alienação será em relação ao quinhão do devedor e não sobre a totalidade de um determinado bem. Porém, a ultimação da expropriação exige partilha e individualização dos bens e direitos que tocarão ao executado.

Depois de realizada a partilha, a penhora dos direitos se convolará em penhora sobre os bens individualizados transferidos ao herdeiro.

Encerrado ao processo de inventário, a penhora se transfere, automaticamente, para o bem que for adjudicado ou que vier a caber ao herdeiro devedor.   

REFERÊNCIAS:

  1. Agravo de Instrumento nº 0075819-35.2020.8.21.7000, 19ª Câmara Cível do TJ/RS, Des. Marco Antonio Angelo, julgado em 01/10/20.
  2. MOUTA, Fátima Pereira, Penhora de quinhão hereditário, https://www.advogadosinsolvencia.pt/penhora/de-quinhao-hereditario, acesso em 13/06/21 às 13:47.
  3. DA CUNHA JR., Dirley, et all. Curso de Direito Processual Civil, Vol. 5, 6ª edição, 2015, Salvador, Bahia.

Por Luciana Marques Farias, advogada colaborativa, atuante na área de Direito das Famílias e Sucessões há 17 anos, pós-graduada em Direito Processual Civil e Direito das Famílias e Sucessões. Conciliadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, membro da Comissão de Direito das Famílias e Sucessões da Associação Brasileira de Advogados no Rio de Janeiro – ABA/RJ, membro do Instituto de Direito das Famílias – IBDFAM, membro da Associação de Direito de Família e das Sucessões – ADFAS. Co-criadora do instablog @pautafamiliar.

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