Autismo no Brasil: Os Desafios que Não Podemos Ignorar

Por Esdras Dantas

No Brasil, milhões de pessoas autistas e suas famílias enfrentam diariamente uma batalha silenciosa. Uma batalha contra a falta de inclusão, contra a escassez de atendimento adequado nas redes hospitalares, contra um sistema educacional que ainda não está preparado para acolhê-los e, acima de tudo, contra a indiferença de grande parte da sociedade. São desafios que não podem mais ser ignorados. São vidas que clamam por respeito, dignidade e direitos que, na teoria, já deveriam estar garantidos, mas que, na prática, ainda parecem distantes da realidade.

Para uma pessoa autista, o mundo pode ser um lugar assustador. Os sons são intensos, as luzes podem ser insuportáveis, e a dificuldade em se comunicar torna a rotina um verdadeiro labirinto de angústias. Para os pais e familiares, cada dia é um teste de resistência. O diagnóstico, que já é um desafio por si só, abre as portas para uma nova jornada cheia de incertezas: onde buscar ajuda? Como garantir o acompanhamento médico e terapêutico adequado? Como encontrar uma escola que respeite e compreenda as necessidades da criança?

A Falta de Atendimento e o Abandono das Famílias

Na saúde, a realidade é cruel. O Brasil carece de políticas públicas que garantam diagnóstico precoce, terapias multidisciplinares e atendimento contínuo para pessoas autistas. Muitas famílias são obrigadas a percorrer quilômetros em busca de especialistas, enfrentando filas intermináveis e um sistema de saúde que simplesmente não está preparado para acolher a neurodiversidade. Os poucos serviços especializados são inacessíveis para grande parte da população, e aqueles que conseguem pagar pelo atendimento particular enfrentam custos altíssimos, tornando o cuidado uma realidade elitizada.

Na educação, a exclusão também persiste. Apesar da legislação garantir o direito à inclusão escolar, na prática, muitas crianças autistas são rejeitadas por escolas que não têm profissionais capacitados, que se recusam a oferecer suporte individualizado e que veem esses alunos como “problema” e não como indivíduos que têm potencial, sonhos e que, com o suporte correto, podem se desenvolver plenamente.

Leis Ameaçadas e Direitos Negados

A legislação brasileira avançou em alguns aspectos, mas ainda há retrocessos preocupantes. Recentemente, propostas que ameaçam os direitos dos autistas têm surgido, colocando em risco conquistas fundamentais, como o direito à inclusão escolar e ao atendimento prioritário. A falta de comprometimento do Estado com políticas públicas eficazes não só prejudica os autistas, mas também esgota física e emocionalmente suas famílias, que vivem um verdadeiro calvário na busca por tratamento, educação e dignidade.

Para a Dra. Cintia Oliveira, presidente da Comissão de Direitos dos Autistas da Associação Brasileira de Advogados (ABA), a sociedade precisa se mobilizar para evitar retrocessos:

“Os direitos dos autistas não podem ser tratados como moeda de troca política ou como algo secundário. Cada vez que negamos acesso à saúde, à educação e à dignidade, estamos falhando como sociedade. Precisamos lutar para que nenhuma família enfrente essa jornada sozinha, para que a inclusão seja uma realidade e não apenas um discurso vazio.”

A Nossa Responsabilidade Como Sociedade

A questão do autismo não é apenas um problema das famílias que vivem essa realidade – é um desafio de toda a sociedade. Precisamos cobrar políticas públicas eficientes, exigir que escolas sejam capacitadas, garantir que o SUS ofereça atendimento especializado e que os autistas tenham espaço no mercado de trabalho. Precisamos romper com o preconceito e com a ideia de que autistas são “incapazes”. Eles são diferentes, sim, mas isso não os impede de serem brilhantes, produtivos e essenciais para o mundo.

Não podemos mais fechar os olhos para essa luta. Precisamos dar voz às pessoas autistas, apoiar suas famílias e garantir que, no Brasil, ninguém seja invisível. A transformação começa na informação, na empatia e na ação.

Que cada um de nós faça a sua parte. Que possamos construir um país onde a palavra “inclusão” não seja apenas uma promessa, mas uma realidade para todos.

Esdras Dantas é advogado, professor e presidente da Associação Brasileira de Advogados (ABA)

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