Artigo. Pai Rico, Filho Nobre, Neto Pobre e o Planejamento Sucessório.

Por Ana Carolina Tedoldi.

Quem nunca ouviu falar de uma família com patrimônio vultuoso que após o  falecimento de um(a) patriarca/matriarca, os filhos colocaram tudo, ou quase tudo, a perder, uma vez que não receberam qualquer preparação para sucessão patrimonial, comportando-se apenas como meros herdeiros?

“Há duas maneiras de se fazer uma fogueira: uma com madeira seca e outra com sementes. Os herdeiros preferem madeira, pois querem resultados rápidos. Já os sucessores preferem as sementes, pois, plantando-as, sabem que terão uma floresta e nunca mais lhes faltará madeira para se aquecer… Você prefere a madeira ou as sementes? – Augusto Cury” [1]

A cada sucessão o patrimônio familiar é restringido naturalmente pelos custos do inventário. A depender do Estado, podemos chegar ao custo de mais de 20% (vinte por cento) sobre o patrimônio deixado, com a soma das custas judiciais/extrajudiciais, registros, imposto de transmissão causa mortis (ITCMD) e honorários advocatícios. E muitas vezes os herdeiros não possuem liquidez imediata para saldar esses custos, o que acaba gerando a necessidade de desfazimento de parte do patrimônio do espólio para então efetivamente finalizar o inventário.

Esse custo da tributação sobre a transmissão gratuita do patrimônio vai aumentar em muitos Estados com a reforma tributária já aprovada, quiçá no Brasil todo. A Reforma tributária aprovada no final de 2023 trouxe a obrigatoriedade do imposto sobre a morte e doação (ITCMD) ser progressivo em todos os Estados da Federação, como já acontece em alguns, por exemplo RJ, DF, PA. Os Estados que ainda possuem alíquotas fixas de ITCMD, como por exemplo AM (2%), SP (4%), ES (4%), MG (5%), dentre outros, precisarão adequar sua legislação estabelecendo alíquotas progressivas que podem chegar até 8%, uma vez que esse é o teto máximo estabelecido pelo Senado Federal através de uma Resolução de 1992. Por sinal, bem antiga para o país da tributação.

E a questão do aumento da tributação sobre o patrimônio não para por aqui. Existem projetos de resolução tramitando no Senado Federal que visam aumentar o teto do ITCMD, sendo que uma delas eleva para o patamar de 16%.

Portanto, existe uma janela aberta para que os brasileiros realizem seus planejamentos sucessórios em vida, reduzindo assim despesas futuras, enquanto a tributação não aumenta.

Mas não é só o custo do inventário que arrasa com uma família. Há tantos outros transtornos que surgem após o falecimento de um ente, como conflitos e discussões intermináveis. E aqui entra o custo do tempo, pois enquanto o patrimônio não é partilhado a deterioração do mesmo continua (despesas, impostos, manutenção).

A princípio o que se mostra de imediato é uma briga por patrimônio, mas que na realidade, o que move os herdeiros ao conflito é a busca por suprir alguma falta, seja de afeto, atenção, amor, etc. E como essa falta não pode ser suprida pelo(a) falecido(a) que já não se encontra mais aqui, é materializada no patrimônio.

E quando falamos em famílias empresárias, a perda pode ser ainda maior. Não só para a família, mas para todos os envolvidos naquela atividade econômica (colaboradores, clientes, fornecedores, credores, etc). Crises financeiras podem ser desencadeadas pela partilha das quotas societárias/ações do falecido. Por isso, tão importante uma previsão de sucessão adequada no contrato ou estatuto social da empresa.

Logo, a cada geração de “herdeiros” a tendência é que o patrimônio familiar seja reduzido. Ao contrário do que acontece a cada geração de “sucessores”.

Por isso, a importância do planejamento patrimonial e sucessório. Através dele há a possibilidade de utilização de instrumentos com o foco de amenizar a passagem do patrimônio entre as gerações. Instrumentos que vão desde a escolha do regime de bens do casamento/união estável até uma estruturação empresarial, passando por testamento, doação, partilha em vida, usufruto, seguro de vida, previdência privada, revisão de contratos/estatutos sociais, estruturas internacionais (offshore, trust, fundação), constituição de holdings, e tantos outros.

Cada núcleo familiar é único e precisa ser tratado na sua individualidade com uma visão 360º da família, abordando o patrimônio familiar sob todos os aspectos com soluções jurídicas adequadas ao seu caso concreto.

O foco principal do planejamento é a paz familiar gerada pela organização, estabelecimento de regras, ordem, garantias, segurança patrimonial e familiar, perpetuação do patrimônio e economia, evitando, assim, conflitos futuros.

Ana Carolina Tedoldi – Advogada especializada em Planejamento Patrimonial e Sucessório da Família, Professora, Palestrante, Co-Autora do Livro 101 Dicas de Holding e do livro Família e Empreendedorismo, Pós-graduada em Direito Privado, MBA em Holding e Planejamento Societário, Presidente da Comissão de Empreendedorismo Jurídico da OAB Barra da Tijuca, Presidente da Comissão Nacional de Planejamento Patrimonial e Sucessório da ABA, Membro do IBDFAM, Membro da Associação Suiça de Prática Jurídica Internacional, Membro da Comissão de Gestão Patrimonial e Family Office da OAB-RJ, Membro da Comissão de Direito de Família da OAB Barra da Tijuca, Membro da Comissão Nacional de Sucessões do IBDFAM, Membro da Comissão Regional Sudeste de Notarial e Registral da ABA.


[1]    CURY, Augusto. Pais inteligentes formam sucessores, não herdeiros. 1.ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 47.

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