Por: CAMILA PRETTO ROSTAND PRATES – OAB/RS 111.019
A responsabilidade penal do médico, oriunda de atos cometidos no exercício de sua profissão, tratam de questões de difícil solução. Em que pese as ações na esfera criminal representarem apenas uma parcela do montante de ações judiciais decorrentes da responsabilidade médica, elas não podem ser ignoradas, pois são várias as situações que podem tipificar uma conduta criminal e suas consequências jurídicas deixam de ser apenas reflexos patrimoniais, adentrando a esfera dos direitos de liberdade do médico.
Na atualidade, as discussões que permeiam o Direito Penal acerca de possíveis responsabilidades imputadas aos profissionais da medicina têm gerado destaque para debates, tendo em vista os recentes acontecimentos criminais envolvendo médicos e a visibilidade dada pela mídia.
Como se sabe, a responsabilização médica pode envolver mais de uma esfera jurídica, de forma que um único ato ilícito na prática da medicina pode ocasionar consequências em 3 esferas distintas, seja na esfera administrativa (ex.: suspensão do CRM), cível (ex.: indenização por erro médico) e criminal (ex.: punição por homicídio culposo).
Na esfera penal, para haver a responsabilização do profissional médico, é preciso estar presente o aspecto formal que define o crime, que se caracteriza como uma conduta prevista no ordenamento como típica, antijurídica e culpável. Além disso, deve estar presente também o nexo de causalidade entre a conduta (típica, antijurídica e culpável) e o resultado. Ou seja, o nexo de causalidade nada mais é do que a interligação entre a conduta do agente e o resultado.
No aspecto médico, a questão de caracterização do nexo causal assume aspectos relevantes, porque nem sempre os resultados esperados pelo paciente serão atingidos pela intervenção médica. A obrigação médica, em regra, é de meio, uma vez que o médico se obriga a atuar com o máximo de zelo e cuidado, esgotando todos os meios possíveis para obter o resultado/cura desejado, mas não se obriga a obtê-lo. A exceção à obrigação de meio advém de alguns tribunais brasileiros que têm entendido que algumas especialidades médicas, principalmente aquelas vinculadas a estética, assumem obrigações de resultado.
Atualmente, mesmo nas especialidades em que os tribunais vêm decidindo como obrigações de resultado, ainda assim deve-se olhar para este conceito com ressalvas, pois o correto seria decidir pelas circunstâncias de cada caso concreto.
É claro que na essência do exercício profissional da medicina há a liberdade de atuação do médico, de acordo com as soluções e técnicas que entender mais adequadas a cada caso. Contudo, tal liberdade não pode ser entendida como imunidade profissional. Ao mesmo passo, é importante pontuar que nem todo resultado adverso na prática médica é sinônimo de erro médico. Contudo, não se está, aqui, negando a ocorrência de erros médicos, mas sim afirmando que além do erro médico profissional existem outros inúmeros motivos que geram aquele mau resultado como por exemplo, as condições hospitalares, ou o fator humano, haja vista que cada organismo pode responder de formas diferentes aos mesmos tratamentos.
Assim, ainda que haja a responsabilização do médico na esfera cível e/ou ética, poderá ser responsabilizado também na esfera criminal quando produzir um resultado ilícito a seu paciente. No atual ordenamento jurídico, os crimes que um médico pode ser indiciado podem ser configurados por dolo ou culpa. Os mais comuns são os crimes culposos, no qual o agente deu causa ao resultado por uma imprudência, negligência ou imperícia. Desta forma, o crime é culposo quando o profissional deixa de empregar a diligência necessária a que estava obrigado e, em face das circunstâncias não percebe o resultado que poderia ter previsto e evitado.
Salienta-se que as condenações criminais, seja do médico ou de qualquer cidadão, somente ocorrem diante da certeza de materialidade e autoria. Na ausência de certeza, opera-se o princípio in dubio pro reo (na dúvida, em favor do réu) com a consequente absolvição. Assim, ao profissional da medicina resta atuar dentro dos limites da literatura médica e da técnica mais adequada, ressaltando-se a importância da observância do dever de cuidado. Portanto, é dever do médico ser prudente e diligente durante o exercício da medicina, devendo sempre observar o dever de informação com o intuito de ser o mais claro possível ao se comunicar com paciente sobre sua doença. A não obediência a quaisquer desses deveres jurídicos e éticos podem resultar em uma conduta criminosa e seus respectivos desdobramentos.
CAMILA PRETTO ROSTAND PRATES – OAB/RS 111.019
Advogada especialista e Pós-Graduada em Direito Médico e da Saúde. Sócia fundadora do escritório Prates & Rockenbach Advocacia e Consultoria Jurídica. Membro representante do Rio Grande do Sul na Comissão Nacional de Direito Médico da ABA. Secretária-adjunta na Comissão Regional Sul de Direito Médico da ABA. Presidente da Comissão da Saúde e Direito Médico da OAB/RS subseção Gramado/Canela.