O objetivo deste trabalho é trazer à reflexão, acerca da facultatividade da contribuição sindical como objetivo de precarização nas relações trabalhistas com o afastamento de representatividade, a luz da reforma trabalhista neoliberal.
Antes de adentrarmos no cerne da contribuição sindical, importante contextualizarmos o surgimento e a importância do sindicalismo no mundo contemporâneo.
O sindicalismo tem origem nas corporações de ofício da Europa medieval no final do século XII, que tinham o objetivo de regulamentar as profissões e o processo produtivo artesanal, evitando a concorrência e garantindo a segurança de seus membros, mediante o pagamento de uma taxa.
O sindicalismo teve seu ápice de crescimento no decorrer da revolução industrial. Época marcada por condições péssimas de trabalho que boa parte dos trabalhadores estavam submetidos. Deste modo, trabalhadores foram unindo forças, para confrontar os empregadores e adquirirem melhorias nas condições diárias de trabalho e de salários.
E não é que deu certo? Diante dessa união dos trabalhadores, que culminou numa maior representatividade, a classe burguesa teve que ouvir as vozes dos trabalhadores, antes ignoradas, e negociar melhorias das condições de trabalho. Dessa união que obteve resultado, surgiram os sindicatos com a finalidade de impedir os abusos sobre os trabalhadores.
No Brasil, diante do seu atraso histórico advindo de um processo de escravidão e colonização, apenas com a imigração europeia já no século XX, uma sociedade desenvolvida quando comparada com o Brasil, no tocante aos direitos trabalhistas conquistados do decorrer da revolução industrial, estes não aceitavam o limbo de direitos trabalhistas aqui ainda existente e passaram a se organizar e por fim criaram os sindicatos.
Os sindicatos somente foram legalizados no Brasil com advento do Decreto n° 979 de 1903, que regulamentou o funcionamento dos sindicatos de trabalhadores rurais da época. No entanto, foi na era Vargas que o país desenvolveu uma maior regulamentação das regras trabalhistas que posteriormente consagrariam a consolidação das leis trabalhistas, CLT. Com isso, as bases das organizações sindicais foram fortalecidas com objetivo maior de defender os direitos dos trabalhadores advindos com a legislação própria, tais como o salário-mínimo, férias, descanso remunerado, estabilidade no emprego, dentre outros.
Diante desse promissor cenário de garantias trabalhistas e crescimento dos sindicatos, a Constituição Federal de 1988, trouxe, em seu diploma, um modelo corporativista controlado pelo Estado, todavia reconhecendo a constitucional investidura sindical e representatividade da categoria, respeitando a liberdade de filiação e desfiliação dos sindicatos, impondo a obrigatoriedade da participação sindical nas negociações coletivas fortalecendo a massa proletariada, além da possibilidades de cobrança de contribuições.
Os sindicatos, assim como toda organização no sistema capitalista, dependem de receita para executarem suas atividades e arcarem com as despesas oriundas de suas atividades. Apesar da possibilidade de desenvolver atividade econômica, as contribuições previstas no art. 548 da CLT continuam sendo a principal fonte de receita das entidades sindicais.
Ocorre que, no atual sistema de governança do país, impera o neoliberalismo. Este, defende a absoluta liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal sobre o mercado financeiro permitindo que este dite os rumos da sociedade, sem interferência de regulação estatal, tornando assim, as relações trabalhistas mais flexíveis, transferindo os riscos do empreendimento do empregador para o empregado
A história já nos ensinou que a irrestrita liberdade entre desiguais leva à opressão. E nos tempos atuais, esta veio com o advento da reforma trabalhista, que dentre as mais de 200 alterações normativas sendo a maioria lesiva ao trabalhador, previu o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical atinge fortemente o orçamento desses sindicatos representativos, empobrecendo e enfraquecendo a luta e a representação coletiva.
A nova redação do artigo do 579 condicionou o desconto da contribuição sindical à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional.
Assim, reforma alvejou em cheio as estruturas sindicais, especialmente por (i) alterar suas bases de representação; (ii) minar os pilares de financiamento das entidades; (iii) redefinir a finalidade dos sindicatos, retirando atribuições de modo a comprometê-los frente ao capital, gerando insegurança, e com diminuição da representatividade, menos direitos suprimidos serão questionados no judiciário.
Dea forma sorrateira e repentina, estas alterações foram instituídas, acarretando o empobrecimento da luta dos trabalhadores. Associado a isso, a desestruturação financeira acarreta a redução do poder negocial, uma vez que a responsabilidade para a garantia das conquistas dos trabalhadores aumenta através da livre negociação, instituída pelo art. 611-A, que possibilita a retirada de direitos em limites inferiores à lei e a consequente precarização das condições de trabalho, ferindo o caráter de direito fundamental conferido à negociação coletiva.
Evidente o intuito de precarização das relações trabalhistas com o advento da reforma trabalhista abraçada ao neoliberalismo. Ao mesmo tempo em que a reforma torna facultativa a contribuição sindical, desestabilizando a relação trabalhador e sindicato, a legislação passa a prever o negociado sobrepondo o legislado. Ou seja, o acordo ou convenção coletiva passam a valer mais que a lei dentro de um cenário de instabilidade na representação do sindicato para com sua categoria.
Sendo a contribuição sindical a única parcela que pode ser cobrada dos trabalhadores não associados, diante da ausência de alternativas eficazes para reparar este dano progressivo, cada vez mais sindicatos serão aniquilados por este neoliberalismo e cada vez mais trabalhadores ficarão desemparados dentro de um cenário de precarização das relações de trabalho.
A reforma da legislação trabalhista se apresenta como o verdadeiro “mito da outorga”, vez que sob o argumento de facilitar a criação de empregos, diminuição dos litígios trabalhistas, bem como modernização da legislação trabalhista, fez alterações legislativas que apagam a luta e conquista dos direitos sociais conquistados pelo proletariado através dos sindicatos.
Deste modo, podemos concluir com tranquilidade que as alterações legislativas introduzidas pela Reforma Trabalhista (lei n. 13.467/2017), ao alterar os artigos 545, 578 e 579 da CLT, fazendo com que a cobrança, até então compulsória, se tornasse facultativa, passando a depender de autorização prévia e expressa dos empregados, acabaram por desestabilizar exponencialmente a relação entre os sindicatos representantes e os trabalhadores representados por este, acarretando, por óbvio, uma maior precarização das relações trabalhistas com o fortalecimento da classe burguesa em detrimento de um proletariado sem representatividade e com cada vez mais direitos suprimidos.
Por Fabriccio Mattos do Nascimento, Advogado Trabalhista pelo Escritório Gameleira Pelagio Fabião e Bassani | Membro da Comissão de Direito Trabalhista da Associação Brasileira de Advogados (ABA/RJ) | Pós-graduando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).