PROTEÇÃO VEICULAR E O DIREITO DO CONSUMIDOR

  • CONTEXTO HISTÓRICO DA PROTEÇÃO VEICULAR

Os grupos privados de proteção veicular iniciaram sua trajetória no Brasil mais especificamente no Estado de São Paulo nos anos 80.

E se desenvolveram com maior abrangência no estado de Minas Gerais, como solução para a classe de caminhoneiros, que viam totalmente excluídos pelo mercado securitário já que o serviço custava caro.

Com o aumento ordinário da frota veicular, roubos, crise econômica e com a chegada ao Brasil em 2014 das empresas de corrida por aplicativo, apresentou um cenário de alta expressiva na demanda pelo serviço de seguro empresarial, e os baixos custos dos grupos de proteção veicular, viabilizou o acesso às camadas da sociedade que até então não tinham proteção para seus veículos.

  • COMO FUNCIONA O MERCADO DA PROTEÇÃO VEICULAR?

A Proteção veicular funciona por meio de organizações de sociedade civil atualmente consolidadas como – associações e cooperativas – com finalidade de alcançar o que parece ser impossível sem tal união, ou seja, a mitigação do risco entre os membros do sistema em caso de sinistro.

Chamadas de atividades do terceiro setor, estes grupos de autogestão foram criados sem finalidade lucrativa e com objetivos de cunho social, visando o benefício dos integrantes do grupo.

  • QUAL DIFERENÇA ENTRE ASSOCIAÇÃO, COOPERATIVA E SEGURO?

A definição de associação conforme o SEBRAE: Uma pessoa jurídica, adequadamente registrada em cartório e constituída livremente pela união da comunidade.

No Brasil o direito a liberdade associativa possui status de cláusula pétrea e têm suporte no artigo 5º, incisos XVII e XXI e 174, § 2, ambos da CF/88.

A maior parte dos grupos de proteção veicular são formalizados no modelo de associações.

Já a cooperativa pode ser definida como um grupo com interesses comuns e finalidade de obter vantagens econômicas, bem como, a distribuição dos dividendos entre seus integrantes.

 Este modelo mundializado que segue normas da aliança cooperativista internacional (AIC) é representado por um órgão na defesa dos seus interesses a organização de cooperativas do brasil (OCB).

Além do apoio constitucional supracitado a lei 5.764/71 disciplina a criação de cooperativas.

Ainda que a natureza das cooperativas permita existência de finalidade lucrativa, ao contrário da associação, em grupos de ajuda privados, apesar de existir uma atividade econômica, inexiste a possibilidade de distribuição entre os seus integrantes de dividendos, sendo obrigatória a aplicação desses recursos integralmente na consecução da respectiva atividade.

Por derradeiro o seguro empresarial é um serviço fornecido pelas seguradoras ou corretoras de seguros, empresas privadas com fins lucrativos, e que sofrem fiscalização de um órgão federal denominado Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) e do Ministério da Fazenda.

A linha que separa a proteção veicular e o seguro empresarial é tênue e sútil marcada pela transferência – mediante pagamento do prêmio – do risco entre segurados e segurador, considerados consumidores, que ocorre em uma modalidade e a divisão de risco e rateio dos custos entre membros do grupo, não considerados consumidores, que ocorre em outra.

  • NO BRASIL A ATIVIDADE DE PROTEÇÃO VEÍCULAR É LICITA?

Criadas com finalidade de intermediadora e facilitadora dos negócios jurídicos entre seus membros e terceiros. Os grupos de ajuda privados, desde que atendam a todos os requisitos legais, são licitas e gozam de proteções legislativas e constitucionais, não permitindo inclusive a interferência do Estado em sua atividade, salvo por ordem judicial transitado em julgado.

Todavia destaco tais prerrogativas não alcançam os grupos que atuam fora do conceito de associativismo e cooperativismo, utilizando-se destes para camuflar a atuação desvirtuada.

  • A APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DO CÓDIGO CIVIL

Para a aplicação da norma cogente (código de defesa do consumidor) há de se observar a relação de consumo que se caracteriza por um ato bilateral, partes bem definidas e de lados opostos. De um lado um fornecedor – aquele que oferece que atua no mercado habitualmente em busca de lucros – e de outro lado o consumidor – que retira do mercado de consumo o produto ou serviço, ou seja, destinatário final -.

Devida a sua função social e conexão direita com a constituição federal, não se tolera renúncia ou redução do “piso” de direitos, através de contratos de adesão, em desfavor do consumidor presumidamente vulnerável, figura privilegiada que depende de proteção legal.

Já a relação das associações e cooperativas é um ato plurilateral, onde os integrantes destes grupos possuem as mesmas obrigações e responsabilidades aplicando-se a estas o (código civil), levado em destaque o princípio “pacto suno servanda” rege sobre a força obrigatória dos contratos, estes que devem ser cumpridos a qualquer custo, todavia, impossibilitando que direitos fundamentais sejam mutilados contratualmente.

  • COMO TEM SE POSSICIONADO O ORGÃO FEDERAL (SUSEP), O LEGISLATIVO E O JUDICIÁRIO EM RELAÇÃO A ESSE TEMA?

Em meio a outros destaco o projeto de lei complementar de autoria do deputado Lucas Vergílio (SD/GO), que tenta, de certa forma, regulamentar atividade, sendo ele o de n. 3.139/2015, que trata dos requisitos para que as associações e cooperativas atuem no mercado de seguros.

Já o Decreto-Lei 73, de 21 de novembro de 1966, dispõem a respeito do Sistema Nacional de Seguros Privados, regulando as operações. Através deste constituiu-se, assim, a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP)

A SUSP é responsável por 200 ações civis públicas e 450 processos administrativos, atualmente em curso, contra cooperativas, associações e outras instituições que operam ilegalmente, sob a forma de seguradoras. Alega que a operação de proteção veicular constitui indubitavelmente um contrato de seguros empresarial, dadas às características de típico contrato de seguro.

A SUSEP por força da resolução n. 243/2011 do CNSP, possuí prerrogativa de fiscalizar e aplicar penalidades a toda e qualquer entidade que atue no mercado de seguros, seja registrada ou não junto a autarquia, incluindo aqueles grupos de ajuda que atuam de forma desvirtuada.

Logo o Judiciário tem se dividido em decisões favoráveis e desfavoráveis ao reconhecimento de uma relação de consumo.

  • CONCLUSÃO

É perceptível a importância dos grupos de ajuda para o interesse comum e principalmente financeiro de milhares de pessoas, cabendo a cada uma destas depois de esclarecidas as regras e os riscos, definirem se aceitam ou não os parâmetros do negócio recebendo de fato, em contra partida, as garantias e proteção prometida.

Porém o que deslegitima a prática é a atuação fora do conceito de associativismo e cooperativismo que traz prejuízo ao integrante.

Em havendo situações de violação a direitos básicos do consumidor praticadas por grupos desvirtuados, o reconhecimento dessa relação de consumo deverá ser suscitado judicialmente, conferindo ao integrante o status de consumidor, bem como o direito de ser reparado pelos danos sofridos, praticados por qualquer figura que integre a cadeia de consumo seja ele o próprio grupo, um subordinado ou empresa terceirizada.

A análise caso a caso é sumamente importante nesse contexto.

Por Lucas Taveira, advogado, pós-graduado em direito civil e processual civil, especialista em direito do consumidor e sucessão, Membro Associação Brasileira de Advogados Goiânia/GO e fundador do portal @acreditonomeudireito.

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