Por Esdras Dantas.
Recentemente, durante uma palestra para empresários e juristas em São Paulo, o ministro Alxandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) fez uma declaração polêmica. Ele atribuiu aos advogados brasileiros a responsabilidade pela morosidade da justiça, argumentando que a prática excessiva de recursos contribui para a desconfiança no ambiente de negócios no país. Embora essa afirmação tenha sido feita com base em uma observação real, é necessário reconsiderá-la à luz de uma análise mais abrangente e justa do sistema judicial brasileiro.
A Realidade dos Prazos Processuais
Os advogados são os únicos profissionais no sistema de justiça que devem cumprir rigorosamente os prazos processuais. O Código de Processo Civil (CPC) estabelece prazos específicos para a realização de atos processuais, e o não cumprimento desses prazos pode resultar em sanções severas, incluindo a perda de direitos. Em contraste, os magistrados, embora também sujeitos a prazos legais para proferir decisões, frequentemente não os cumprem, levando meses ou até anos para emitir despachos, decisões interlocutórias e sentenças.
Os Desafios Enfrentados pelos Magistrados
É importante reconhecer os desafios enfrentados pelos magistrados. Muitos juízes têm uma carga de trabalho imensa, com um número elevado de processos sob sua responsabilidade. No entanto, isso não justifica a falta de cumprimento dos prazos, especialmente quando esses atrasos têm um impacto direto sobre a eficácia e a credibilidade do sistema judicial.
A Realidade das Agendas dos Magistrados
Outro fator contribuinte para a morosidade da justiça é a gestão das agendas dos magistrados. Frequentemente, os processos não entram em pauta de julgamento porque os magistrados relatores estão ocupados com compromissos fora da comarca, como viagens, licenças, recessos e férias. Essa realidade demonstra que a questão da morosidade judicial não pode ser simplificada como resultado exclusivo da atuação dos advogados.
Impacto da Morosidade Judicial no Ambiente de Negócios
A lentidão no sistema judicial brasileiro tem consequências profundas para o ambiente de negócios. Investidores e empresários buscam um sistema jurídico eficiente e confiável. Quando os processos se arrastam por anos, a incerteza aumenta, desincentivando investimentos e prejudicando a economia. Portanto, é fundamental que todos os atores do sistema de justiça, incluindo magistrados, sejam responsabilizados por seus papéis na manutenção da eficiência processual.
A Prática de Recursos e o Direito de Defesa
A prática de interpor recursos, mencionada pelo ministro do STF, é um direito fundamental no sistema jurídico brasileiro, garantido pela Constituição. Esse direito assegura que todas as partes em um processo tenham a oportunidade de questionar decisões judiciais, promovendo uma justiça mais equânime. A crítica à prática de recursos deve ser vista com cautela, pois restringir esse direito pode comprometer a própria essência do devido processo legal e o direito de defesa.
Conclusão
A morosidade da justiça brasileira é uma questão complexa que não pode ser atribuída unilateralmente aos advogados. Enquanto os advogados cumprem prazos rigorosos, os magistrados frequentemente não conseguem atender aos mesmos padrões, contribuindo significativamente para os atrasos processuais. A eficiência do sistema judicial depende de uma responsabilidade compartilhada entre todos os seus participantes. Melhorar essa eficiência é fundamental para restaurar a confiança no ambiente de negócios e promover uma justiça mais célere e justa.
A declaração do ministro do STF precisa ser reconsiderada e contextualizada. É essencial adotar uma abordagem equilibrada que reconheça os desafios enfrentados por todas as partes e busca soluções sistêmicas para melhorar a eficiência do judiciário brasileiro.
Esdras Dantas é advogado, professor, jornalista e presidente da Associação Brasileira de Advogados (ABA)